domingo, 31 de julho de 2011

Aprendendo...


                 Ler é deixar as palavras brincar dentro da gente. Elas vão... Abrem uma porta. Adentram o cômodo. Mexem nos baús. Reviram as gavetas. Escancaram as janelas e se voltam... Abrem outra porta. Invadem o espaço livre, mudam as poltronas de lugar. Deitam na cama e dormem. Sonham! Levantam-se espreguiçando e, num grande bocejo, abrem outra porta: ligam a tv, ligam o rádio, o tocador de fitas... E ficam extasiadas ao som de uma música antiga. Deleitam-se! Dançam! Rodopiam! Bailam um bailado sincronizado e mudo. Depois, cansadas, extenuadas pela dança, abrem uma nova porta e se põem a contemplar o jardim. Revolvem a terra dos canteiros: plantam margaridas. Malmequeres e bemmequeres. Contemplam as orquídeas. Brincam com os colibris. Um sapo desavisado aparece e elas tratam de pôr o bichinho para correr.
                    Já é noite e as palavras continuam sua odisséia... Escorregam pelo trampolim e caem risonhas numa piscina de bolinhas coloridas. Brincam de esconde-esconde. Achei! Tímidas, correm para contar a peripécia para um verbo, mas ele, emaranhado com um substantivo fora de forma, fecha-se na sua intransitividade e deixa o leitor confuso. As palavras, brincalhonas, com pena do leitor, abandonam o verbo e se enlaçam num adjetivo desavisado que cruzou o caminho. Surge uma metáfora meio amarelada e se joga em cima do adjetivo na tentativa de explicar para o leitor que aquelas palavrinhas estavam apenas de brincadeira. Convencidas do equívoco, as palavras se soltam e, livres do adjetivo e da metáfora, abrem outra porta e se jogam numa prateleira cheinha de letrinhas. Ali, escondidinhas, jogam no leitor uma ideia fixa. Ele se levanta, vai até a escrivaninha, pega um lápis e começa a buscar as palavras que estão escondidinhas...
                  Agora, o leitor virou escritor e as palavras passam a brincar no papel e dentro dele. Num entra e sai meio maluco, elas propõem ao escritor que deixe o lápis livre... Abandone as ideias pré-concebidas e aceite viajar com elas pelo labirinto do desconhecido. Lá vão elas e ele... Esperem! O texto surgirá assim que eles voltarem dessa mágica aventura!

Roziner Guimarães