quarta-feira, 27 de abril de 2011

Dá licença!


... Antes, eu talvez dissesse: "Dê-me licença!",
mas hoje eu digo, sem medo, "dá licença"
e aí me lembro de "Pronominais"
e aí me vem uma preguiça da gramática.
Ainda bem que hoje eu posso e me permito
dizer: "dá licença, hoje eu posso e vou ousar."
Coloco tomate nas unhas
e saio por aí com elas coloridas de vermelho
prontas para arranhar...
Não tenho hora para sorrir e nem choro fora de hora...
O relógio joguei fora:
Deito e me levanto quando quero...
Não preciso me refugiar no sono
nem me esconder no sonho noturno.
Vivo rio, cachoeiras e trilhas
e me arrepio com o pio dos passarinhos...
Hoje, eu posso dizer:
"Deixa disso, camarada, me dá licença
a vida me chama e eu me encanto
com o canto do beija-flor..."
Se nem tudo é poesia
a culpa não é minha!


Havia sim "uma pedra no meio do caminho",
que deixou uma corzinha de vinho tinto,
marcando o gostinho
do meu poder e da minha ousadia.
Portanto, "dá licença, vou curtir minha alegria!"

Roziner Guimarães

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Logo os ipês florescerão

 
Abro as asas... 
Pássaro migrando em outra direção!
Logo será primavera
e os ipês floridos aguardam o meu pouso.
Contemplarei as matas,
os bosques,
as cachoeiras,
os rios e os riachos
e escolherei, dentre eles, onde construirei meu ninho!

Roziner Guimarães


quarta-feira, 13 de abril de 2011

Continuo refletindo sobre a (des)educação...


Disse Renée Descartes: “Cogito, ergo sum” (Penso, logo existo) ou ainda “Dubito, ergo cogito, ergo sum” (Eu duvido, logo penso, logo existo). Ele instituiu a dúvida: só se pode dizer que existe aquilo que puder ser provado, sendo o ato de duvidar indubitável. Baseado nisso, ele buscou provar a existência do próprio eu (que duvida, portanto, é sujeito de algo) e de Deus. Em outras palavras, pensar, duvidar, é viver. Será ainda assim? Eu duvido de tantas coisas... Penso sobre elas... Busco respostas... Só isso me confere o status de sujeito cidadão?

Semana passada, todos nós assistimos estarrecidos a notícia do assassinato de doze adolescentes na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. De lá para cá, só se fala sobre isso nas televisões de todo o país. Por que aquele ex-aluno matou tantos adolescentes? Por que tanta crueldade? O que levou Wellington Menezes de Oliveira, de 23 anos, a praticar esse crime tão bárbaro?

Em outras palavras, a especulação gira em torno dos motivos que levaram esse jovem a cometer o crime e depois se suicidar. Investigam sua vida pregressa, sua história de vida... E, numa dessas investigações, é encontrado um vídeo em que ele, demonstrando frieza e, como querem os especialistas, “problemas mentais”, fala sobre bullying. Ele pensou e matou. E as especulações se voltam para esse problema social: “teria ele sido vítima de bullying?” Pergunto: Sendo ou não vítima de bullying, isso justifica o seu ato? E as famílias que perderam seus filhos? Por que faço essas perguntas? Porque, aqui, no Brasil, tem-se a tendência de tornar vilões em super-heróis. Todo mundo chora e lamenta e o problema em si não é resolvido. Passam-se alguns dias e a vida volta ao (a)normal.

Retomando o pensamento de Descartes e lendo sobre a história de Wellington, percebo que ele pensou, duvidou de Deus e do mundo, e, portanto, existiu... Mas ele pode ser chamado de “cidadão”? Foi sujeito de uma ação premeditada que chocou todo o país e, agora, a mídia o está transformando em “vítima social”. Mas o que será feito para que outros Wellingtons não pratiquem o que ele praticou? 

Francisco Gutiérrez, no movimento pela Ecopedagogia, parafraseando Descartes, afirmou que todos nós, inclusive no meio acadêmico, deveríamos refletir sobre este outro pensamento: "Sinto, percebo, sonho, amo!..logo existo”. E, desculpem-me, mas não é isso que tenho visto, pelo menos, em grande parte da população brasileira e, sobretudo, no meio acadêmico, onde a ecopedagogia talvez seja até desconhecida por muitos. O sentimento, a percepção, o sonho e o amor inexistem na maioria das salas de aula. O que reina entre os alunos é o lema: “tenho, logo existo”... “Tenho dinheiro para pagar esse diploma... Tenho dinheiro e posso ficar no barzinho... Tenho dinheiro e...”. Entre alguns professores o lema é parecido: “tenho meu trabalho, logo existo”... “Tenho de pagar minhas contas no final do mês... Tenho de aceitar isso... Tenho de compactuar com essa des-educação... Tenho emprego...” Entre os “donos dessa des-educação”, o lema muda pouco: “Tenho dinheiro e poder, logo existo”... “Tenho poder, faça o que eu mando... Tenho poder, execute... Tenho poder, obedeça... Tenho poder e...”

O “ter” se sobrepõe ao “ser”. “O outro que se dane, eu preciso ter...” Nessa sobreposição, todos são co-participes da des-educação e abandonam a cidadania. 

 Se o exemplo que dei acima não é suficiente, trago outros. Fui professora de Língua Portuguesa e, nesta semana, uma ex-aluna me ligou pedindo: “aulas de gramática, porque estou estudando para um concurso”. Leitura que faço: “Tenho de passar nesse concurso, por isso preciso aprender (o mínimo) português”. Em outra época, estudava-se português, porque (eu acreditava, acredita?) é o meu idioma. É por meio dele, falando ou escrevendo, que eu me comunico com os outros. Ler e escrever com eficiência é (eu também acreditei nisso) uma das mais efetivas práticas de cidadania. Talvez seja mesmo em algum outro país. No Brasil, ler é uma habilidade que poucos têm. Escrever só para quem lida com a escrita: jornalistas (e olhe lá!), poetas...

Por incrível que pareça e mesmo que soe aqui como arrogância ou falta de ética de minha parte, alguns professores não têm o hábito da leitura e da escrita. Escrever, para muitos deles, é “um horror”, pelo menos é o que tenho ouvido e visto em textos produzidos por alguns deles: graduados, especialistas, mestres e doutores.  

Se os dois exemplos não conseguem ainda fazer com que você, leitor, compreenda esse meu ponto de vista, cito outro. Vi e ouvi certa escola fazendo seu merchandising: “a escola tal oferece um diferencial na educação de seu filho: o teatro”. Colocar o teatro dentro da escola é oferecer um diferencial na educação? Para não ser tão radical, eu diria que depende. Ao oferecer aulas de “teatro”, a escola não estaria apenas oferecendo um “diferencial” para “chamar clientela”? O que essas aulas de teatro acrescentarão na vida dos estudantes? Nada tenho contra o teatro, pelo contrário, acredito sim na possibilidade de essa estratégia ser muito benéfica na educação. Mas não pode ser vista tão somente como um “diferencial”, isto é, como algo para “ter mais alunos”.

O que sinto e percebo é que a educação virou uma estratégia para o “ter”. Quer mais um exemplo? Para ser professor, precisa-se, no mínimo, fazer um curso superior que contemple a disciplina de Didática. O que se vê hoje na sala de aula? Profissionais de diferentes áreas ministrando aula sem o mínimo de conhecimento didático. Eram (ou ainda são) médicos, administradores, advogados, engenheiros e, agora, são (também) professores. E o que falar dos “dirigentes da educação” (diretores, vice-diretores) sem esse tipo de conhecimento? Como “administrar” a educação sem saber o que é educação? Mas é compreensível: a educação passou a ser mercadoria, alguns espaços educacionais viraram empresas, alguns profissionais viraram funcionários dessa empresa, alguns alunos passaram a ser clientes. Talvez seja, por isso, que muitos de meus amigos-colegas de profissão têm afirmado: "Não vejo a hora de me aposentar", o que confirma o que venho discutindo: "Tenho (falta) pouco tempo para me aposentar, por isso aguento..."

A educação virou mesmo um grande palco... É o teatro da vida!

 Volto ao meu caso particular, é por tudo isso que eu deixei de sonhar e de amar essa educação que aí está. Talvez seja por isso que eu esteja doente. Mas eu  sofro de uma lucidez “alternativa”. E essa lucidez tem me feito perceber que minhas crenças, atitudes e certezas, definitivamente, não cabem neste cenário “educacional”. Sim, ao duvidar dessa panacéia educacional, eu passo a existir para mim novamente. Nesse meu novo existir, sinto que muitas coisas estão deixando de valer a pena, e sei porquê, e outras coisas estão ganhando significado. Minha esperança não desmoronou por inteiro.

E aí me vem alguns, talvez ainda míopes (ou compactuantes dessa “nova” educação?), dizendo que o mundo mudou, isto é, são outros os parâmetros, outras as pessoas, outras as atitudes... A vida mudou e que eu devo me adaptar a essa “nova” realidade. Que minhas crenças e valores estão ultrapassados para este mundo. É, sou obrigada, de certo modo, a concordar com eles. Eu ainda acredito no diálogo, na força do amor, na sinceridade, no “ser”, mas desacredito totalmente que a educação, do jeito que está, cerceada, obedecendo ao “Sistema” e sendo sistematizada no “ter”, possa fazer algo pela cidadania. Recordo um velho jargão que já ouvi milhares de vezes: “Estou terminando a faculdade. Deixarei de ser o futuro do Brasil para ser um problema social”. Em assim sendo, embora possa parecer paradoxal, prefiro ficar com minhas crenças ultrapassadas, pois só conseguirei “ser” fora dessa “nova” realidade.  

Roziner Guimarães