terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O que eu quero é o meu querer...

                

               Conheço gente que sabe de tudo... Que tudo vê! Tudo percebe! Tudo entende! Tem sempre uma palavra para tudo... Eu estou descobrindo que nada sei! Tudo que eu pensava que sabia, tem hoje outras respostas. Minhas crenças desvaneceram... Minhas ideologias adormeceram... Meus sonhos foram mutilados... E minhas perguntas agora estão mudas. Sem ganchos. Resignadas. Apavoradas na constatação de que de nada adianta perguntar, inquirir, investigar... 

               Tem gente que sabe de tudo, mas, para minhas perguntas, só respostas vazias. Nada me dizem... Nada acrescentam. E sabe por quê? Porque as respostas hoje são pessoais. Cada um tem uma resposta, mas essa resposta é para si mesmo, e, embora possa parecer paradoxal, muitas pessoas acreditam que suas respostas são coletivas. Ao tentar "dar respostas para as perguntas alheias, minimizam seus "problemas", esquecem deles, afinal, ao "se preocupar com o outro", seu "problema" foi guardado na gaveta da "ajuda mútua". E ainda afirmam: "ao lhe ajudar, eu me ajudei". Quanta hipocrisia numa época de "falsa" coletividade. Quem se preocupa com quem? Quem tem tempo para se preocupar com o outro?

         O que eu quero é o meu querer... Não é mais o querer do outro. Vivemos individualmente, embora se pregue, por aí, a necessidade do coletivo. Coletivo? Alguém tem tempo para o outro? Sim, tem, nas redes sociais em que o "encontro é virtual". Para os encontros reais ninguém mais tem tempo. Em sendo assim, nas redes sociais, a solidariedade é linda! Mas, na prática, onde reside esse tal coletivo? Isolamo-nos em nós mesmos, muitas vezes por necessidade. Para buscarmos nossas próprias respostas ou até mesmo para formularmos nossas perguntas. O que o outro pensa, pensa para ele... O que eu penso, penso para mim. Tento resolver o meu "problema"... Mas, nas redes sociais, estamos "juntos" e... Separados! Fácil exercer "o faz-de-conta que ligo, que me importo, que me solidarizo"...  "Coitado do cachorrinho enterrado vivo"... "Que horror mataram fulano..."  Mas alguém parou para pensar nas pessoas vivas-mortas? Existem tantas por aí... Apenas sobrevivendo, porque mataram seus sonhos... Acabaram com sua dignidade... Roubaram suas fantasias... Espantaram suas verdades... 

               Talvez para se sentirem "bem", publicam tantas pregações: "Deus é fiel!"... "Quem tem Deus no coração não sente solidão"... Colocam Deus como solução para tudo e Ele é, desde que a pessoa faça a sua parte... Mas essa é a minha verdade e ela é relativa, eu sei. Mas, como eu sou crítica (ainda acabo com essa mania horrorosa), fico me perguntando: será que essas pessoas já pararam para pensar que pregam para si mesmas? Tenho para mim que, quando falamos, falamos para nós mesmos... É uma busca de "salvação!" Tentamos salvar a nós mesmos, "fingindo" salvar o outro. É que, quando tentamos "ajudar o outro", temos a sensação de estar contribuindo para o progresso da humanidade... E aí nossa alma, por instantes, aquieta-se na sua dor, afinal "a alma é coletiva", mas... 

               Mas, voltando às reflexões, é justamente por pensar assim que pouco tenho postado nas redes sociais. E, quando posto, falo de mim... Se posto ainda, acredito, deve ser para "ter algo pra fazer nas horas inúteis"... Tenho tido pouco tempo para o outro, porque estou, sem culpa nenhuma, cuidando de mim. Tenho tanto para "remendar", "descoser", "costurar"... É um trabalho de reconstrução mesmo. De derrubar tudo e começar de novo.  Mas aí me chega um desavisado e se mete a me dar conselhos... Meu Deus, se ele soubesse como "não preciso deles"... A resposta está dentro de mim... A cura para todos os males está dentro de cada um... Então, dá vontade de dizer o que meu sobrinho diz: "se conselho fosse bom era vendido"... Mas, por educação (ainda não me desvencilhei de todas as minhas bases), escuto! Às vezes choro, ao ouvir esses conselhos. Choro, porque "mexem nas minhas feridas", mas não colocam o remédio, apenas cutucam... Cutucam e as fazem sangrar novamente... Quando sangram, param! Parece que sentem prazer com a dor alheia. Noutras vezes, apenas escuto silenciosamente. Adianta dizer tudo o que estou escrevendo aqui? "Nadica de nada!".
             
               Então... Que venham os pregadores de plantão. Entendo-os... Comigo também ocorre isso. Às vezes, minha personalidade crítica (ainda acabo com ela) quase me obriga a "criticar" uma ou outra coisa que vejo nas redes sociais, mas aí me lembro de que cada um sabe de si e me calo... Tenho muito para fazer para me preocupar com aquilo que eu considero "erro". Que "erro"? Besteira! Cada um tem suas próprias verdades... Eu estou em busca das minhas... E como isso toma tempo... E cansa! Portanto, embora esse texto pareça uma crítica, ou até tenha um teor crítico. Não é essa minha intenção. São apenas reflexões.

               Talvez, por tudo isso, pouco tenho escrito, porque escrevo para "limpar as ruas repletas de lama"... "É uma ginástica aeróbica... Tento modelar o corpo da ginasta"... Mas essa ginasta anda relapsa e sem vontade nenhuma de escrever. Embora ela saiba dessa necessidade, tem preferido, interiormente, cantar: "Calma alma minha/Calminha!/Você tem muito/Que aprender...", porque "mesmo quando tudo pede/Um pouco mais de calma/Até quando o corpo pede/Um pouco mais de alma/Eu sei, a vida não para/A vida não para..."

          E aí... "Eu fico com a pureza das respostas das crianças"... E, como tudo é mesmo paradoxal, descubro que, embora não compreenda nem aceite ainda estas dores, "Sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu..."

Roziner Guimarães

sábado, 29 de outubro de 2011

Sem sentido...





               Talvez eu devesse começar este texto com uma citação de Mário Quintana ou Ferreira Gullar, Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector... Afinal, grandes escritores têm muito a dizer, mas, neste momento, nenhuma voz que não seja a minha consegue se fazer ouvida. Minha mente, no momento, está num trelelê desconexo. Vagabundeando por caminhos avulsos e cheios de curvas perigosas. Deixo que ela serpentei bastante... Tagarela, como ela está, precisa regurgitar sua disforia convexa. Mas, confesso, estou por demais cansada do seu falatório... Cansada, literalmente cansada, de dar trela a ela. E, como sei que escrever é, para mim, um santo remédio... Meio zonza com sua prolixidade, arregaço as mangas, melhor, desnudo-me de mim, e voo. Nesse voo, encontro-me n"O Divã" e ouço Martha Medeiro dizendo que: "Viver tem que ser perturbador, é preciso que nossos anjos e demônios sejam despertados, e com eles sua raiva, seu orgulho, seu asco, sua adoraçao ou seu desprezo. O que não faz você mover um músculo, o que não faz você estremecer, suar, desatinar, não merece fazer parte da sua biografia".
               Ora,  "já me fiz a guerra por não saber que essa terra encerra o meu bem querer, que jamais termina o meu caminhar". Aí começa uma ladainha de outras vozes e encobre minha voz interior. Creio que ela se refugia em algum cantinho escuro que me esqueci de iluminar. Então, tartamudeando ainda um resquício de querer falar, quedo-me na certeza de que "só o amor me ensina(rá) onde vou chegar." Eu preciso me cumprir para enxergar o horizonte. Estou fazendo a travessia... Longas noites insones... Longos dias esfarelados e do avesso... Longo, muito longo, esse caminho. Mas, como me avisa Ricardo Reis: "Colhamos flores. Molhemos leves as nossas mãos nos rios calmos, para aprendermos calma também. Girassóis sempre fitando o sol, da vida iremos tranquilo, tendo nem o remorso de ter vivido..." Girassóis!!! Lembro-me de que eu, ingenuamente, pensei "agora, vamos ter os girassóis no fim do ano", mas o "calor foi desumano"... Sorte que eu tinha (tenho) "mais um santo para esculpir" e isso é que me vale e faz "evitar que o rancor suas ervas se espalhe"...
               Tentei buscar respostas... Perguntei... Indaguei... Percorri caminhos tortuosos demais por isso. Agora estou no meu limite... Aquele limite em que se compreende que o que importa não são as indagações, porque as respostas nem sempre virão... E, se vierem, podem não corresponder às nossas expectativas... Afinal, cada qual vive a sua verdade... E as respostas se cruzam, entrecruzam, confundem-se e acabam vilipendiando o que pensávamos ser verdadeiro. E não era? E teimam a voltar os ganchos para me fisgar... É, talvez eu tenha deixado ser usurpada por tanta tagarelice e isso me fez perder a calma, mas as erranças fazem parte da caminhada. Viver parece sério demais. E eu estou tentando me "desacostumar" dessa seriedade. Quero deixar de ser trágica para ser mágica. Brincar de borboleta cansa!
               ... É que teimo em auscultar meu incendioso coração. Mas, agora, volto para mim novamente e leio com calma o que escreveu Mário Quintana: eu queria "decifrar o mistério da alma, o sentido da vida, mas, no fim, só me restou a poesia, outro enigma! " Espero que, "passada esta azia transcendental", eu encontre a paz e a serenidade. Emoções... Como não tê-las? Erranças a procurar sentido no desconhecido... Naquilo que denominamos, mas desconhecemos, o amor.  Vou ser colibri!


Roziner Guimarães

sábado, 6 de agosto de 2011

Estranhamento...

                    
               Sinto-me estranha... Estranho o meu ser sincero e leal a seus valores... Esvazio minhas gavetas tantas vezes já remexidas e, nelas, o que encontro me faz perceber ainda mais este estranhamento. Minhas verdades se desfolham com o inverno. Minha história tem muito de mistério e parece que foi pintada pelo avesso... Mas, de repente, paro numa imagem e percebo que, ao pintá-la, eu tinha plena consciência desse meu abandono voluntário. Sempre fui mesmo meio eremita. A solidão eu desconhecia. Seduzia-me o silêncio e o majestoso estar só. Mas, agora, parece-me que estou fora de minha estrada. Meus pés me levam para onde? Que ausência de mim é esta? 

               Fui me espalhando por tantos cantos e, num canto qualquer, acabei me perdendo. Hoje estou tentando me encontrar... Por isso, talvez essa dor tão doída e já cansada de doer. Pinto, escrevo, leio, contemplo-me e não me vejo em nada do que tenho feito. Mas aí vem Clarisse Lispector e me avisa "...não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento." Deparo-me com a sensação de estar vivendo num mundo estranho, desconhecido... Como se eu fosse aqui uma alienígena. E acho mesmo que sou... Outros valores... Outras crenças... Filosofia tão vã!
    
               Algo não combina com minha pressa! E, paradoxalmente, minha alma pede calma... Uma calma que não encontro em mim. Estou tentando me ensinar a ter essa calma de que preciso. Mas, paulatinamente, meus olhos desmentem a tranquila intraquilidade dos meus dias! Quando posso, choro! Quando posso, ensaio novos passos... Tropeço em minha ingenuidade e caio direto na ansiedade dessa busca, mas nem sei o que buscar... Miragem! Sinto que estou indo embora... E essa viagem me apavora! Acho que estou em fase de germinar! Mas o adubo parece não ajudar a germinação... Estou tentando me descobrir, porque, ultimamente, tenho sido uma incógnata até mesmo para mim. Então, dê-me licença: estou em busca de mim! Ser efêmera me emociona, mas também me habilita para novas andanças!

Roziner Guimarães

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

A poesia inacabada...

               
               No meio de um verso inacabado, encontrei uma rima solta e, com ela, passei a construir outra poesia. Li Fernando Pessoa. Drummond. Lispector. Quintana... Cecília Meireles e João Cabral de Melo Neto. Com cada um deles, fui me descobrindo e descobrindo um mundo totalmente colorido e cheio de pontos e pré-pontos. Nessa viagem, emaranhei-me em letras, pingos e pontos. Gostei das entrelinhas e me escondi no meio de uma delas. Lá fiquei uma eternidade. Quando resolvi sair, abri a página do meio e empurrei uma palavra que se encontrava solta bem no meio da página. Lutei com ela...
                Na interinidade da vida, entreguei meus desejos e me vi desejada e, quando pude, abri o baú, esquecido no canto do quarto, e tirei de lá uma saudade amarelada e cheia de culpa. No meio desse caminho, tinha um laço enlaçando minha vaidade... Ao tentar lhe dar um nó, tropecei numa vírgula colocada propositalmente entre um anacoluto e outro. Solucei! Mas solução não encontrei. Balbuciei palavrões... Borrões mancharam as páginas do livro que eu lia... Eram lágrimas fingindo ser chuva num dia de inverno.
             Esqueci-me de que eu era mestra na arte da sedução e me deixei levar pelos malabarismos semânticos de um tal substantivo que cruzou meu caminho num momento de silábica ilusão. Soletrei demoradamente meu desespero e, quando dei por mim, já estava, como traça, devorando outro livro... Buscava nova poesia. Rabisquei meus delírios... Guardei os nós na gaveta... Fingi ser analfabeta e fechei o livro. 
                Quando o abri novamente, suas páginas estavam pintadas de dourado e eu me vi desenhando nelas minha própria existência. Eu era criador e criatura. Minha história estava recomeçando e eu fazia questão de rescrevê-la num poema para que, quando eu quisesse visitá-la, pudesse encontrá-la nas rimas ricas criadas em estrofes ilimitadas... Eu tinha me cansado dos poemas em linhas retas. Os alexandrinos me davam náuseas. Nada de métrica. Nada de perfeição. Agora o poema exigia a liberdade de um haicai. Mas eu queria mesmo era uma poesia nua e crua na qual eu pudesse simplesmente ser eu a própria poesia.

Roziner Guimarães

domingo, 31 de julho de 2011

Aprendendo...


                 Ler é deixar as palavras brincar dentro da gente. Elas vão... Abrem uma porta. Adentram o cômodo. Mexem nos baús. Reviram as gavetas. Escancaram as janelas e se voltam... Abrem outra porta. Invadem o espaço livre, mudam as poltronas de lugar. Deitam na cama e dormem. Sonham! Levantam-se espreguiçando e, num grande bocejo, abrem outra porta: ligam a tv, ligam o rádio, o tocador de fitas... E ficam extasiadas ao som de uma música antiga. Deleitam-se! Dançam! Rodopiam! Bailam um bailado sincronizado e mudo. Depois, cansadas, extenuadas pela dança, abrem uma nova porta e se põem a contemplar o jardim. Revolvem a terra dos canteiros: plantam margaridas. Malmequeres e bemmequeres. Contemplam as orquídeas. Brincam com os colibris. Um sapo desavisado aparece e elas tratam de pôr o bichinho para correr.
                    Já é noite e as palavras continuam sua odisséia... Escorregam pelo trampolim e caem risonhas numa piscina de bolinhas coloridas. Brincam de esconde-esconde. Achei! Tímidas, correm para contar a peripécia para um verbo, mas ele, emaranhado com um substantivo fora de forma, fecha-se na sua intransitividade e deixa o leitor confuso. As palavras, brincalhonas, com pena do leitor, abandonam o verbo e se enlaçam num adjetivo desavisado que cruzou o caminho. Surge uma metáfora meio amarelada e se joga em cima do adjetivo na tentativa de explicar para o leitor que aquelas palavrinhas estavam apenas de brincadeira. Convencidas do equívoco, as palavras se soltam e, livres do adjetivo e da metáfora, abrem outra porta e se jogam numa prateleira cheinha de letrinhas. Ali, escondidinhas, jogam no leitor uma ideia fixa. Ele se levanta, vai até a escrivaninha, pega um lápis e começa a buscar as palavras que estão escondidinhas...
                  Agora, o leitor virou escritor e as palavras passam a brincar no papel e dentro dele. Num entra e sai meio maluco, elas propõem ao escritor que deixe o lápis livre... Abandone as ideias pré-concebidas e aceite viajar com elas pelo labirinto do desconhecido. Lá vão elas e ele... Esperem! O texto surgirá assim que eles voltarem dessa mágica aventura!

Roziner Guimarães
 




domingo, 19 de junho de 2011

Copos estilhaçados...



... Aí eu quebrei um copo e tive a deliciosa sensação de alívio! Quebrar o copo me fez perceber o quanto minha raiva é interior e o quanto ela está entranhada em mim. O desejo agora era quebrar outro copo e mais outro e outros... Mas olhei meus copos e tive pena de quebrá-los. Que culpa eles tinham? E, "eu que culpa tenho?", fiquei me interrogando. "Perdoar e amar" é isso que tenho ouvido. Fácil falar em perdão e amor quando é a gente que viveu na pele o que causou a raiva. Muito fácil. Eu lá quero perdoar!? Quero expor minha raiva. Exorcizá-la. Invadi-la por inteiro até vê-la ser consumida. Raiva não se apaga com perdão. Ela precisa ser vivenciada. Sentida. Nada de tentar subjugá-la. Ela é tangente. E convergente... O lugar dela é o coração, mas ela se espalha pelo corpo todo e se transforma em dor. Olha que eu tenho competência para dizer isso.

Por isso, ela precisa ser sentida em sua plenitude. Vivenciada. Presentificada. E eu o que fiz com minha raiva? Eu a calei! Eu tentei emudecê-la! Enfiei a raiva no recôndito do meu ser. Sabe por quê, meu camarada? Porque me ensinaram que "menina boazinha perdoa", "menina boazinha não fica com raiva". Às favas com esse ensinamento. Primeiro que não sou boazinha coisa nenhuma. Segundo que tudo isso é uma grande mentira. Dessa "educação de mentirinha" estou cheia. O escambau com ela. Quero pôr minha raiva para fora. Por que tenho de guardá-la só para mim? Alguém irá percebê-la assim guardadinha dentro do peito?! Ah, vai!? Mas, quando eu começar a reclamar de dores e mais dores... Essas dores da alma..., aí terá sempre alguém para dizer: "Perdoa! Ama!" Ama o escambau! Perdoa o escambau! Eu não quero nenhuma dor para mim. Quem a provocou que fique com ela, caramba!

Estou me desfazendo das mentiras que me contaram. Dou um basta nesta educação moralista. Pura verborreia! Coisa de quem acredita que "Deus é vingativo". "Não faz isso, pois Deus castiga", "Deus quer que perdoemos os nossos inimigos", "Deus ofereceu a outra face". Aff!, como diz minha irmã! Se esse deus castiga quem sente raiva, quem explode, porque já não aguenta mais tanto sofrimento... Se esse deus castiga... Se esse deus pede para dar a outra face, quando recebemos "um tapa na cara"... Perdoa-me, mas esse deus é ruim. Ele quer que eu deixe o outro bem enquanto eu fico mal?! Então, ele não gosta de mim, C... Aí vem com aquela história de "recompensa no pós-morte". Nesta Terra de Ninguém, preciso sofrer para ser feliz depois? Isso é o que Deus quer??? Duvido!!!

O Deus em que acredito me quer livre... Quer que eu seja feliz. Quer-me sem máculas. Mas, guardando a raiva (perdoar não é humano. Nem vem com essa que não cola mais), não estaria eu maculando meu corpo e alma? Só pode falar o contrário quem tem a "ficha limpa". Você tem? Você consegue realmente perdoar? O escambau que consegue!!! Vejo um milhão de gente dando testemunhos de perdão. Tudo bem, camarada, fique você com sua dor. Perdoe, se você consegue! Eu não consigo! E, se para me livrar de minha dor, eu tiver que gritar minha raiva, vou gritá-la sim!!! Que se dane quem não quiser ouvi-la!

Que fique bem claro para os desavisados (aqueles que só sabem ler as linhas e se esquecem das entrelinhas) que eu não estou aqui fazendo apologia de nada. Não defendo a violência! Não defendo as agressões! Não é nada disso! Apenas não irei aceitar passivamente aquele discurso de "beata"! Vou cuspir minha raiva sempre que eu tiver com ela entalada na minha garganta. Cansei de sentir dores! Cansei de "ser a boazinha!" Eu serei boazinha se você não me ofender... Serei boazinha se você me respeitar... Serei boazinha sim! Mas respeite meus limites! Do contrário, não engulirei sapos nem pererecas ou qualquer outro batráquio que estiver de plantão na hora que você despejar sua deselegância para cima de mim. Vou devolvê-la na mesma velocidade que ela vier... Portanto, meu chapa, seja você quem for, lembre-se que a "boazinha" morreu no instante em que ela percebeu que, ao tentar perdoar, esquecer ou "ser  boazinha", apenas adquiriu para si  dores terríveis que só ela sente... Você (repito: seja lá quem for) está (ficou) por aí livre, leve e solto(a)... Eu estou aqui quebrando copos e me livrando de dores que são suas. Por enquanto, palhaço(a)!

Ufa!!! rs rs

Roziner Guimarães

sábado, 11 de junho de 2011

Descobertas...


... Eu fiquei me perguntando: "O que eu estava fazendo ali?" "Que sentimentos eu experimentava?" "O que tudo aquilo me revelava?" Esses ganchos me fisgando e eu tentando dar a eles uma resposta que nem sei ao certo qual é, apesar de uma leve desconfiança a seu respeito. Mas, como tomei a decisão de ser pesquisadora de mim, não me contentei com a desconfiança... 


Poucas pessoas tinham chegado para a festa. (Festa? Ou seria apenas uma confraternização? Confraternizava-se o quê?). Poucos carros estacionados. Procurei por um em especial. Mas ele não estava estacionado ali. Sinal de que ele ainda não tinha chegado... Estacionei o meu carro e resolvi entrar. Entrei. Vi algumas pessoas (sei lá se conhecidas... Não me recordo!). Olhei para trás e vi uma mulher conhecida. Ela estava num outro cômodo da casa, mas eu a podia ver pela "janela", isto é, uma abertura igual àquela de restaurante, por onde os cozinheiros entregam a comida ao garçon para ser servida aos fregueses. Essa mulher usava um vestido de festa junina e estava com o cabelo em tranças. Pareceu-me que ela preparava alguma comida. Ela me disse alguma coisa que também não me recordo o que seja.

Saí dali para ir embora. Muitos carros estavam agora estacionados lá fora. O meu carro estava bem no fundo do estacionamento. Fui até ele e pensei: "Como farei para sair daqui?" Entrei no carro e, na minha frente, tinha uma cratera enorme. Não dava para seguir em frente. Continuei olhando e vi uma "picape", aquela camionete antiga, tentando atravessar aquele buraco. As rodas traseiras da picape estavam "patinando" sobre o abismo. Pensei: "Ih... vai cair". Se caiu, não sei. Engatei marcha à ré e, quando olhei para trás, também tinha ali uma cratera. Mas, inda assim, manobrei o carro e consegui sair. Não consigo diagnosticar o meu sentimento naquele instante. Segui em frente. Deparei-me com uma ponte, que mais parecia uma pinguela feita de gravetos e cipós. Essa "ponte" era estreita e estava meio quebrada. Parece que senti um pouco de medo. Mas, mesmo assim, decidi atravessá-la com meu carro. Pisei no acelerador, que estava amarrado por um cipó, e esse cipó arrebentou. Segui em frente com o carro. Atravessei a ponte e, no final dela, tinha uma porta. Abri a porta...
 Algumas respostas me ocorreram. Mas a maior delas é a certeza de que a decisão é seguir em frente, enfrentando o medo se ele vier. A passagem é, sem dúvida, perigosa, mas há uma saída. É preciso apenas abrir a porta. Do outro lado, está a vitória.

Roziner Guimarães

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Terra seca

  Época de seca! Queimadas! Solo ressequido!
Escrever se torna um exercício de aeróbica:
A palavra mergulha num silêncio quase atávico
como se convidasse o poeta para apenas olhar...
Sentir os vãos e desvãos da vida
e se esgueirar no mesmo mutismo das árvores secas
para poder ouvir seus gemidos de dor e renúncia...
E a poesia se esfacela numa rima perdida
na estrábica estrofe coroada de mal entendidos
tamanha é a dor do poeta!

Roziner Guimarães

domingo, 8 de maio de 2011

Sonhos de uma bailarina


Hoje amanheci cheia de mim:
Abri a porta e dei de cara com meu baú cheio de sonhos.
Entregue em mil malabarismos,
eu cantava alheia ao vento
que agitava as folhas de outono
e me fazia rodopiar como dançarina em pleno salão de baile.
Olhei de soslaio para mim
e me vi seminua dançando ao ritmo de um tango argentino.
Ao meu lado, um cavalheiro me tomava nos braços
e me embalava ao som de beijos voluptuosos...
Fechei os olhos e me entreguei ao sabor daquele beijo.
Bailei como nunca havia bailado!
Quando abri os olhos,
estava gostosamente jogada em minha cama
e um novo doce beijo me convidava para mais um tango.
Voei para a Argentina.
Antes, deixei, na porta do quarto,
um bilhete pendurado,
em letras mal escritas:
"Não perturbe!Aqui sonha uma bailarina!"

Roziner Guimarães


























quarta-feira, 27 de abril de 2011

Dá licença!


... Antes, eu talvez dissesse: "Dê-me licença!",
mas hoje eu digo, sem medo, "dá licença"
e aí me lembro de "Pronominais"
e aí me vem uma preguiça da gramática.
Ainda bem que hoje eu posso e me permito
dizer: "dá licença, hoje eu posso e vou ousar."
Coloco tomate nas unhas
e saio por aí com elas coloridas de vermelho
prontas para arranhar...
Não tenho hora para sorrir e nem choro fora de hora...
O relógio joguei fora:
Deito e me levanto quando quero...
Não preciso me refugiar no sono
nem me esconder no sonho noturno.
Vivo rio, cachoeiras e trilhas
e me arrepio com o pio dos passarinhos...
Hoje, eu posso dizer:
"Deixa disso, camarada, me dá licença
a vida me chama e eu me encanto
com o canto do beija-flor..."
Se nem tudo é poesia
a culpa não é minha!


Havia sim "uma pedra no meio do caminho",
que deixou uma corzinha de vinho tinto,
marcando o gostinho
do meu poder e da minha ousadia.
Portanto, "dá licença, vou curtir minha alegria!"

Roziner Guimarães

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Logo os ipês florescerão

 
Abro as asas... 
Pássaro migrando em outra direção!
Logo será primavera
e os ipês floridos aguardam o meu pouso.
Contemplarei as matas,
os bosques,
as cachoeiras,
os rios e os riachos
e escolherei, dentre eles, onde construirei meu ninho!

Roziner Guimarães


quarta-feira, 13 de abril de 2011

Continuo refletindo sobre a (des)educação...


Disse Renée Descartes: “Cogito, ergo sum” (Penso, logo existo) ou ainda “Dubito, ergo cogito, ergo sum” (Eu duvido, logo penso, logo existo). Ele instituiu a dúvida: só se pode dizer que existe aquilo que puder ser provado, sendo o ato de duvidar indubitável. Baseado nisso, ele buscou provar a existência do próprio eu (que duvida, portanto, é sujeito de algo) e de Deus. Em outras palavras, pensar, duvidar, é viver. Será ainda assim? Eu duvido de tantas coisas... Penso sobre elas... Busco respostas... Só isso me confere o status de sujeito cidadão?

Semana passada, todos nós assistimos estarrecidos a notícia do assassinato de doze adolescentes na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. De lá para cá, só se fala sobre isso nas televisões de todo o país. Por que aquele ex-aluno matou tantos adolescentes? Por que tanta crueldade? O que levou Wellington Menezes de Oliveira, de 23 anos, a praticar esse crime tão bárbaro?

Em outras palavras, a especulação gira em torno dos motivos que levaram esse jovem a cometer o crime e depois se suicidar. Investigam sua vida pregressa, sua história de vida... E, numa dessas investigações, é encontrado um vídeo em que ele, demonstrando frieza e, como querem os especialistas, “problemas mentais”, fala sobre bullying. Ele pensou e matou. E as especulações se voltam para esse problema social: “teria ele sido vítima de bullying?” Pergunto: Sendo ou não vítima de bullying, isso justifica o seu ato? E as famílias que perderam seus filhos? Por que faço essas perguntas? Porque, aqui, no Brasil, tem-se a tendência de tornar vilões em super-heróis. Todo mundo chora e lamenta e o problema em si não é resolvido. Passam-se alguns dias e a vida volta ao (a)normal.

Retomando o pensamento de Descartes e lendo sobre a história de Wellington, percebo que ele pensou, duvidou de Deus e do mundo, e, portanto, existiu... Mas ele pode ser chamado de “cidadão”? Foi sujeito de uma ação premeditada que chocou todo o país e, agora, a mídia o está transformando em “vítima social”. Mas o que será feito para que outros Wellingtons não pratiquem o que ele praticou? 

Francisco Gutiérrez, no movimento pela Ecopedagogia, parafraseando Descartes, afirmou que todos nós, inclusive no meio acadêmico, deveríamos refletir sobre este outro pensamento: "Sinto, percebo, sonho, amo!..logo existo”. E, desculpem-me, mas não é isso que tenho visto, pelo menos, em grande parte da população brasileira e, sobretudo, no meio acadêmico, onde a ecopedagogia talvez seja até desconhecida por muitos. O sentimento, a percepção, o sonho e o amor inexistem na maioria das salas de aula. O que reina entre os alunos é o lema: “tenho, logo existo”... “Tenho dinheiro para pagar esse diploma... Tenho dinheiro e posso ficar no barzinho... Tenho dinheiro e...”. Entre alguns professores o lema é parecido: “tenho meu trabalho, logo existo”... “Tenho de pagar minhas contas no final do mês... Tenho de aceitar isso... Tenho de compactuar com essa des-educação... Tenho emprego...” Entre os “donos dessa des-educação”, o lema muda pouco: “Tenho dinheiro e poder, logo existo”... “Tenho poder, faça o que eu mando... Tenho poder, execute... Tenho poder, obedeça... Tenho poder e...”

O “ter” se sobrepõe ao “ser”. “O outro que se dane, eu preciso ter...” Nessa sobreposição, todos são co-participes da des-educação e abandonam a cidadania. 

 Se o exemplo que dei acima não é suficiente, trago outros. Fui professora de Língua Portuguesa e, nesta semana, uma ex-aluna me ligou pedindo: “aulas de gramática, porque estou estudando para um concurso”. Leitura que faço: “Tenho de passar nesse concurso, por isso preciso aprender (o mínimo) português”. Em outra época, estudava-se português, porque (eu acreditava, acredita?) é o meu idioma. É por meio dele, falando ou escrevendo, que eu me comunico com os outros. Ler e escrever com eficiência é (eu também acreditei nisso) uma das mais efetivas práticas de cidadania. Talvez seja mesmo em algum outro país. No Brasil, ler é uma habilidade que poucos têm. Escrever só para quem lida com a escrita: jornalistas (e olhe lá!), poetas...

Por incrível que pareça e mesmo que soe aqui como arrogância ou falta de ética de minha parte, alguns professores não têm o hábito da leitura e da escrita. Escrever, para muitos deles, é “um horror”, pelo menos é o que tenho ouvido e visto em textos produzidos por alguns deles: graduados, especialistas, mestres e doutores.  

Se os dois exemplos não conseguem ainda fazer com que você, leitor, compreenda esse meu ponto de vista, cito outro. Vi e ouvi certa escola fazendo seu merchandising: “a escola tal oferece um diferencial na educação de seu filho: o teatro”. Colocar o teatro dentro da escola é oferecer um diferencial na educação? Para não ser tão radical, eu diria que depende. Ao oferecer aulas de “teatro”, a escola não estaria apenas oferecendo um “diferencial” para “chamar clientela”? O que essas aulas de teatro acrescentarão na vida dos estudantes? Nada tenho contra o teatro, pelo contrário, acredito sim na possibilidade de essa estratégia ser muito benéfica na educação. Mas não pode ser vista tão somente como um “diferencial”, isto é, como algo para “ter mais alunos”.

O que sinto e percebo é que a educação virou uma estratégia para o “ter”. Quer mais um exemplo? Para ser professor, precisa-se, no mínimo, fazer um curso superior que contemple a disciplina de Didática. O que se vê hoje na sala de aula? Profissionais de diferentes áreas ministrando aula sem o mínimo de conhecimento didático. Eram (ou ainda são) médicos, administradores, advogados, engenheiros e, agora, são (também) professores. E o que falar dos “dirigentes da educação” (diretores, vice-diretores) sem esse tipo de conhecimento? Como “administrar” a educação sem saber o que é educação? Mas é compreensível: a educação passou a ser mercadoria, alguns espaços educacionais viraram empresas, alguns profissionais viraram funcionários dessa empresa, alguns alunos passaram a ser clientes. Talvez seja, por isso, que muitos de meus amigos-colegas de profissão têm afirmado: "Não vejo a hora de me aposentar", o que confirma o que venho discutindo: "Tenho (falta) pouco tempo para me aposentar, por isso aguento..."

A educação virou mesmo um grande palco... É o teatro da vida!

 Volto ao meu caso particular, é por tudo isso que eu deixei de sonhar e de amar essa educação que aí está. Talvez seja por isso que eu esteja doente. Mas eu  sofro de uma lucidez “alternativa”. E essa lucidez tem me feito perceber que minhas crenças, atitudes e certezas, definitivamente, não cabem neste cenário “educacional”. Sim, ao duvidar dessa panacéia educacional, eu passo a existir para mim novamente. Nesse meu novo existir, sinto que muitas coisas estão deixando de valer a pena, e sei porquê, e outras coisas estão ganhando significado. Minha esperança não desmoronou por inteiro.

E aí me vem alguns, talvez ainda míopes (ou compactuantes dessa “nova” educação?), dizendo que o mundo mudou, isto é, são outros os parâmetros, outras as pessoas, outras as atitudes... A vida mudou e que eu devo me adaptar a essa “nova” realidade. Que minhas crenças e valores estão ultrapassados para este mundo. É, sou obrigada, de certo modo, a concordar com eles. Eu ainda acredito no diálogo, na força do amor, na sinceridade, no “ser”, mas desacredito totalmente que a educação, do jeito que está, cerceada, obedecendo ao “Sistema” e sendo sistematizada no “ter”, possa fazer algo pela cidadania. Recordo um velho jargão que já ouvi milhares de vezes: “Estou terminando a faculdade. Deixarei de ser o futuro do Brasil para ser um problema social”. Em assim sendo, embora possa parecer paradoxal, prefiro ficar com minhas crenças ultrapassadas, pois só conseguirei “ser” fora dessa “nova” realidade.  

Roziner Guimarães

sexta-feira, 11 de março de 2011

Testemunho


Prólogo

               Começo pelo avesso: justificando o emaranhado de temas deste texto. Acordei com uma ideia fixa na cabeça: preciso escrever sobre isso. E de onde virá a inspiração? Do ensaio de Pedro Demo: “A educação, após Auschwitz”? Do filme de Steven Spielberg “A Lista de Schindler”? Do livro de Michel Foulcault “Vigiar e punir”? Do poema de Eduardo Alves da Costa “No caminho com Maiakóvski” ou do mito de Sísifo? Imagino que de todos eles, porque, embora tratem de temas diferenciados, em todos eles pode-se ler a amargura, a hostilidade, a arrogância, a estupidez... Mas se pode também perceber a esperança e a quase súplica à reflexão. Portanto, a partir deles, nasceu:

Testemunho

Assim foi...

               Escrevi já faz algum tempo que estou em “tempo de mudanças”. Mas as mudanças não ocorrem por acaso e nem de um dia para o outro. Elas vêm-se fazendo diuturnamente. Na que me embrenhei agora, nasceu, creio, em 2002, quando terminei o mestrado. Naquela época, eu estava cheia de sonhos e o desejo de mudança era tanto que, apesar das ondas, fui remando... Oito anos se passaram. Enfrentei marés baixas e cheias. Tsunamis. Mas pensei que seria possível alcançar, se não uma ilha paradisíaca, pelo menos um lugar tranquilo e sereno onde eu pudesse, de fato, exercer com dignidade a profissão que escolhi. Que nada! Meu barco acabava encalhado na areia... Mas eu era resistente. Empurrava-o e o punha de volta a velejar... Eu era sísifo renascido.

Assim é...

              ... Hoje, depois de várias vezes tentar desencalhar meu barco, cansei-me do olhar de “eu mando, você obedece”. Cansei-me do indisfarçado, mas silencioso, “cala a boca”. Cansei-me do “obrigado a fazer de conta que faz, mas não faz”. Cansei-me do “blá blá blá”... Spencer Johnson, autor de “Picos e Vales”, se soubesse que o livro dele é lido para nada, talvez chorasse. Livros de autoajuda não ajudam a curar a analfabeta cegueira de alguns, que não compreendem que quem está em cima, no pico, pode voltar para o vale. Talvez, por isso, eu tenha me cansado também dos murros na mesa para demonstrar um sórdido e falso poder. Cansei-me da sinistra hipocrisia que ronda a profissão do “faz de conta”. Eu não nasci para “fazer de conta”. Eu faço conta de tudo que faço, porque acredito no que faço... Faço com amor. E é, justamente, por não aceitar o “faz de conta” que me tornei dispensável. Foulcault concordaria comigo e diria: “a punição, (minha cara), é o meio encontrado pelo poder para tentar corrigir as pessoas que infligem as regras ditadas pelo poder. Por meio da punição, as pessoas terão receio de cometer algo contrário às normas do poder.” Meu caro Foulcault, por não aceitar o adestramento, como tantos outros, fui para a “Lista de Schindler”!

               Parti, então, com a alma lavada e com a certeza do dever cumprido, mas trago esta reflexão: na “Lista de Schindler, quem foi “listado” ganhou a vida e quem ficou fora continuou no campo de concentração e depois foi morto. Todo cuidado é pouco... Quem será a próxima vítima?

As reminiscências...


               Minha formação pessoal e profissional sempre esteve pautada na esperança, na civilidade, no respeito às minhas crenças e ao próximo. As escolas em que estudei eram humanistas. Além disso, faço parte de uma família em que o respeito, a consideração e o afeto sempre estiveram em foco. Meu pai, apesar de ser dentista prático, honrou sua profissão até o fim. Por que eu desonraria a minha? Isso me faz lembrar os versos de Eduardo Alves da Costa,
"[...]
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
[...]"

               Se eu aceitar essa violência, amanhã nem voz mais terei. Nem motivos para escrever. Nem para viver.

As consequências...

                Essa educação “concentrada”, como nos campos de Auschwitz, fez com que eu abrisse mão de ser educadora. Deixei de acreditar que eu pudesse fazer algo para mudar essa realidade. Comecei a ficar angustiada e perdi totalmente o desejo de estar em sala de aula. Ali eu já não me significava, embora percebesse em alguns (poucos) alunos e professores o também desejo de significância. Mas somos raros... Eu estava me tornando “médica” e, assim como os médicos em Auschwitz, eu também estava aviltando minha profissão me “unindo” (sem querer) a tantos outros, naquela região da Polônia, chamados de doutores da infâmia. Eu “ajudava” a exterminar não mais a falta de conhecimento de meus alunos, pelo contrário, “compactuando” com essa educação, no mínimo, deselegante, eu matava neles um ser humano mais digno e capaz de mudar essa realidade.

                 Como afirmou Hebbel: "Existem coisas que devem causar a perda da razão, ou então não se tem nenhuma para perder". Eu perdi a razão: adoeci. Fiquei deveras contaminada pelo vírus da indecência humana. As dores  ficaram por demais fortes e o desencanto pela profissão foi uma das consequências dessa contaminação. Creio estar sofrendo da Síndrome de Burnout. Mas isso agora pouco importa. Estou em voo para outras paragens...

                Não vou dizer que não volto para a sala de aula. Talvez eu volte um dia, mas posso dizer, com toda certeza, se voltar, não voltarei como alguém sufocada nas câmaras de gás de uma sala de aula. Voltarei, se acreditar que será diferente. Voltarei se tiver a oportunidade de vivenciar as “belas teorias” na prática. Não estudei para ver aprisionados os meus ideais... Não estudei para viver “uma mentira pedagógica”... Estudei porque a educação me encantava. Estudei porque estar em uma sala de aula era para mim motivo de orgulho tanto como aluna quanto como professora...

               Agora percebo que Perrenoud, Adorno, Gadotti, Paulo Freire, Mafesolli e tantos outros, para muitos, não passam de “lindas teorias” para serem discutidas em encontros pedagógicos de início de ano, mas totalmente impossíveis de serem vivenciadas. Que Auschwitz não se repita! Eu vou ao encontro de novos horizontes. Meu voo se eterniza na esperança!


Roziner Guimarães



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terça-feira, 8 de março de 2011

Ser mulher...

               
                Ser mulher é muito mais do que usar sutian e vestir vestido. Maria Madalena (mulher que andou entre os caminhos do pecado e da salvação), Cleópatra (rainha egípcia que agitou o cenário político romano), Joana D'Arc (a heroína francesa), Nzinga Mbandi (Rainha do Ndongo, atual Angola, combatente destemida, exímia estrategista militar e diplomata astuciosa), Anita Garibaldi (importante revolucionária do século XIX), Rainha de Sabá (Após a morte do pai, assumiu o trono em Marid com apenas 15 anos de idade) são apenas alguns exemplos de mulheres que fizeram História. 

               Também poderia figurar nessa lista: Eva, Esther, Sara, Princesa Isabel, Madre Tereza de Calcutá, Clarice Lispector, Anita Malfatti, Chiquinha Gonzaga, Nélida Piñon, Benedita da Silva. Também não podemos  nos esquecer de que, se hoje as mulheres têm um dia só delas, isso se deve ao fato de 129 operárias, nos Estados Unidos, terem morrido queimadas numa ação policial,  porque, guerreiras, reivindicaram a redução da jornada de trabalho de 14 para 10 horas diárias e o direito à licença-maternidade. E o que todas essas mulheres têm em comum? Atitude! 
  
               É sobre atitude e determinação que amanheci pensando hoje. Nós mulheres temos de assumir uma postura mais firme em qualquer setor de nossas vidas, seja no financeiro, no social, no amoroso. Decididamente, não podemos deixar de sonhar e nem que matem nossos sonhos. Temos de ter pulso firme em relação à nossa vida. Somos fortes e capazes de conquistar grandes vitórias! Não importa se estamos lidando no campo das artes, da literatura, da política, da educação, da solidariedade ou se somos somente donas de casa. Temos de ser ousadas, afinal Mulheres Ousadas Chegam Mais Longe, escreveu Lois P. Frankel. A ousadia provoca, instiga, faz alarde e revela a força de uma mulher. 

               Nossos desejos não podem ser vilipendiados como se simplesmente não existissem. A nossa verdade precisa ser respeitada. Precisamos ser ouvidas, amadas. Não podemos ficar, por exemplo, repetindo este trecho da música Clarisse cantada por Renato Russo:

"Viver em dor, o que ninguém entende
Tentar ser forte a todo e cada amanhecer.
 .........................................................
Ninguém entende, não me olhe assim
Com este semblante de bom-samaritano
Cumprindo o seu dever, como se fosse doente
Como se toda essa dor fosse diferente, ou inexistente
Nada existe pra mim, não tente
Você não sabe e não entende"


               Nós não somos "Clarisses" e, por isso, não podemos ficar trancafiadas em nossos quartos.  Também não somos Amélias. Somos pássaros e, se estamos presas, seja lá  por qual for o motivo: uma dor que insiste em doer, um remorso, uma culpa sem culpa, um desejo não realizado, um medo, uma ameaça, devemos abrir as asas e tentar alçar outros voos, mesmo que, para isso, tenhamos de reaprender a voar.

               Minha mãe é uma dessas mulheres que aprenderam a voar e hoje ela voa livre no seu pequeno-grande espaço. Em nome dela, eu parabenizo a todas essas mulheres guerreiras que souberam "dar a volta por cima" e viveram ou vivem dignamente e felizes. Às que ainda estão presas, eu desejo que se libertem e assumam uma atitude digna de sua feminilidade.

Roziner Guimarães 

                
            

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Será que você sabe ler de verdade?


                Nunca me dei muito bem com os substantivos. Não adianta ter substância se essa substância não é qualificada, determinada. Prefiro os adjetivos e os verbos. Os adjetivos, porque qualificam ou determinam o substantivo.  Os verbos, porque indicam ação. É a palavra por excelência. "No princípio, era o verbo..."  A partir do verbo, é possível criar. Verbo e adjetivo são, pois, a matéria-prima para quem lê e escreve. Em outras palavras, sem os verbos e os adjetivos não se vive de verdade. Não adianta , por exemplo, nomear um ser se não o qualifica ou o determina. Casa é sempre casa. Mas a minha é a minha casa. Tem suas particularidades. Seus meandros. A casa do outro é a casa dele... Também é singular, embora possa ter algo de coletivo como a minha. Essas singularidades só se tornam possível a partir do adjetivo, cujo valor é subjetivo, por excelência. O que quero dizer é que, para se utilizar o substantivo, antes é preciso usar o verbo para criá-lo e para dar a ele uma qualificação.
               Recorrer, pois, ao dicionário sempre que se precisa de um qualificador talvez não seja a melhor estratégia. Para qualificar, é necessário "sentir", e o dicionário não sente. Ele não pode ter ações como "pensar", "sentir", "perceber". Ações são típicas dos homens. Mas alguns preferem falar a agir. "Quem fala muito tem pouco a dizer." Não é a quantidade que exprime a clareza. Não é o "saber ler" que norteia o significado. Muitas vezes as palavras podem ser ditas no silêncio. Mas, eu sei, para muitos, isso é difícil de ser compreendido. É que a maioria das pessoas não aprendeu a ler. Apenas balbucia palavras. E sai por aí tecendo críticas e comentários... Fazendo-se de grande leitor. Lê as palavras, contudo não consegue dar a elas, ao conjunto delas, o sentido real. Fica nas linhas. Esquece as entrelinhas. As cores. As imagens. As  metáforas... Não olha nos olhos... Não observa o contraste, a sintonia, a continuidade, a atemporalidade... 
               Ler exige mais ação e sintonia com o todo que envolve a palavra. Sintonizar é sentir. É se comprometer com os sentimentos advindos da leitura. Lê bem quem se entrega à leitura. Entregar é a ação de abandonar... É necessário se abandonar naquilo que está sendo lido.  Abandonar-se significa observar,  prestar atenção aos detalhes...  Exige comprometimento com o que se lê. Não importa se essa leitura é de um livro, de um momento, de uma pessoa, de um espaço... É, por essa razão, que discuto a  importância do verbo e do adjetivo. Sem ação não há qualificação, determinação. Se houver, ela poderá estar recheada de equívocos. E é isso que, na maioria das vezes, ocorre nas leituras em que não se empreendeu a ação de "ler de verdade". Ficou-se apenas na superfície. Não houve mergulho. E, se não houve esse mergulho, a leitura é insensível, sem fundamentos práticos. Não deve ser levada em consideração. Ou o leitor fez uma leitura fria, distante do sentido, porque não sabe mergulhar,  ou ele, mesmo sabendo, preferiu ficar à tona e aí fez  uma "crítica" apenas para dizer que disse algo. Num ou noutro caso, nem o verbo nem o adjetivo devem ser levados em consideração.
               Sem "ler de verdade", "entregar-se à leitura",  é impossível qualificar, determinar. Ler é verbo. Entregar-se é verbo. Observar é verbo. Mergulhar é verbo. Considerar é verbo. Portanto, caro leitor, não  posso admitir que me leia, pensando que está comendo a sopa que você não gosta ou recorrendo ao dicionário para encontrar palavras para sua ignorância adjetival. Não suporto leitores ingênuos, despreparados, incautos.
               Pode me ler à vontade, mas, por favor, aprenda a usar o verbo! Depois, pode até me nomear ou adjetivar! Quando o leitor é realmente um leitor e não um ledor, as críticas são sempre bem-vindas! Pronto, falei!

Roziner Guimarães

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

O mundo gira... Girassois



 O meu mundo gira... 
Nele girassóis! 
Se canto ou se rio... Se choro ou me apavoro... 
Olho para o céu e encontro as cores que colorem o meu desejo... 
Ouço o som da liberdade 
e sintonizo o sol do meu maior Amor.
Nada há que me encanta mais neste momento
do que um campo com seus girassóis! 
Sem eles, talvez eu fosse apenas um galho seco... 
Com eles, rolo e canto!
Pinto girassóis... Extravaso...
E os meus olhos se acalmam 
como calmas são as noites na primavera!

Roziner Guimarães




quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Poeta em horas impróprias (?)




Creio que a poesia nasceu comigo... (Ou fui eu que nasci com a poesia?!). Sei lá. Paro agora para pensar sobre isso... (Ultimamente tenho parado para pensar em tantas coisas!). Minha mãe passou cinco anos casada e, só depois de vários tratamentos para estancar uma hemorragia, eu nasci. Sou fruto de um sangue estancado. Talvez isso tenha me feito acreditar que o mundo era redondo e eu o centro dele, afinal fui gerada a partir de um grande amor. E foi assim que sempre vivi. Acreditando que eu tudo posso e que o mundo é maravilhoso. Fiz da minha vida um enorme palco onde eu sempre desempenho o papel de personagem principal. Das palavras arranco o meu sossego e desassossego. Lembro-me do orgulho que senti quando aprendi o alfabeto... Sabia-o de frente para trás e de trás para frente. Eu não o tinha decorado. Pelo contrário, o alfabeto se introjetara em mim de tal forma que eu nunca mais viveria sem ele. Meu pai sonhou em ver sua filha professora. E lá fui eu: realizando o sonho dele e o meu. Mas eu deveria ter escutado minha mãe. Hoje eu estaria alinhavando minhas mágoas e medos e costurando com linhas menos coloridas algumas passagens da minha vida. Mas isso é uma outra história...    

Descobri que a poesia meio que me alimenta e me alucina. Sem ela talvez eu fosse apenas metade do que sou. Embora meio desajeitada com a “vida”, sou íntima das palavras. Elas me significam. Sem elas, talvez eu fosse apenas espectro de mim. Não sou de falar... Mas as palavras nem sempre precisam ser ditas... Podem ser escritas... Lidas. No meio de tantas letras e sinais, encontro a articulação exata para identificar minha existência. Talvez eu seja mesmo bruxa... Fada? Não. Eu sou apenas poeta. E ser poeta é ser mais que o barulho da chuva no telhado... Ser poeta é significar os vãos da vida. Não. Ser poeta é ser. É materializar o “imaterializável”, inaugurando no ser o desejo de apenas ser... Um ser que é, porque é.  Nasci personagem de mim. E fui levando a vida acreditando nas crenças que me ensinaram. Aprendi que se deve ser educado. Não roubar. Não matar. Respeitar o outro. Ser leal. Honesto. Trabalhador. Mas me esqueceram de dizer que essas crenças me levariam a um nostálgico sentimento de incredulidade ao perceber que lá fora o “real” é fictício. É preciso ser polido e político. Não sou. Meu polimento não foi feito com ouro de tolo... Aí está a diferença. Agora venho descobrindo que a poesia às vezes nasce na hora imprópria... E culpa nenhuma tenho nisso. Foi a poesia que me encontrou e não eu a ela.

Vasculhando meus avessos, dei de cara com rimas desconexas. Sonetos ultrapassados. Uma métrica dissonante e difusa. E eu ali feito bobo da corte olhando e não conseguindo achar nenhuma graça na poesia. Para aqueles que acreditam que escrevo nas horas impróprias, digo: isso pouco me importa. Importa que não perdi a vontade de escrever... Tenho texto pronto e não posso publicá-lo agora. Tudo tem seu tempo. Talvez por isto eu esteja vasculhando os avessos de mim: Procuro dar forma àquilo em que já não acredito mais. Talvez seja por isso também que a poesia se esgueira para a planilha da prosa. Uma prosa prosaica desandada e quase sem nexo para alguns. É a forma de se me significar. Em meio à catástrofe limítrofe só encontro os assombros de um riso meio rouco e sinistro... E dou risadas também! Em tempo de enchentes, se tem impermeabilidade, a ironia me atravessa e ridicularizo o riso dos canhotos... Se um ou outro leitor não entender a narrativa... Culpa nenhuma tenho nisso, sou apenas poeta. Não escrevo para leigos. Professora já fui. Agora é um novo tempo. Brinco de pique- esconde e atravesso o melhor de mim. È assim que a poesia se instala em mim. O resto é apenas resto.

Roziner Guimarães

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Tempo de mudanças



Entra ano, sai ano, e os desejos das pessoas vão mudando... Algumas desejam mudar a cor do cabelo, mudar de residência... Arrumar um namorado! Casar... Ter filhos! Outras querem se separar... A palavra de ordem é mudança. Entretanto, a maioria fica apenas no desejo, porque mudar não é tão fácil assim. Exige coragem. Determinação! Ousadia! E, por ironia do destino, quando se fala em mudança, geralmente o sentimento mais real e constante é o medo. Mudar causa medo! Paradoxalmente, o novo excita e apavora! Vislumbram-se novos caminhos, mas a possibilidade de encontrar pedras e buracos na caminhada breca os desejos e faz com que as pessoas fiquem estagnadas no velho. Deixam-se ficar na antiga sonata de existir... “Amanhã, eu mudo...”. “Vou esperar chover para eu plantar...”. “Vou pensar direito sobre esse assunto, depois eu vejo...” E, assim, com essas desculpas, protelam-se os desejos. E aí surgem as insatisfações, a angústia, o estresse...
O desejo é, segundo o site da Wikipédia, “uma tensão em direção a um fim considerado pela pessoa que deseja como uma fonte de satisfação.” Deseja-se porque tem carência do objeto desejado. Essa carência pode ser resultado de várias causas, mas em todas elas está o descontentamento com a atual situação vivenciada. Como não existe uma varinha de condão para realizar os desejos das pessoas, elas ficam, na maioria das vezes, no sonho, porque têm medo de correr riscos. Mudar é arriscar a situação financeira, o status...  Então, é preferível ficar estagnado. Pelo menos, o lugar onde se está é conhecido... A cor do cabelo não está boa, mas, com a mudança, pode piorar... Melhor sozinho do que mal acompanhado... Filhos dão muito trabalho... E a pessoa entristece! Passa a automatizar suas ações. Vive um conflito entre o ser e o querer... Perde a vontade de viver!
Todavia, se se quer ser pelo menos um pouco feliz, é vital a mudança. E, para tanto, arriscar é necessário e urgente. A frase “a vida é curta”, apesar de ser um chavão, revela a urgência da/na mudança.
Ando com desejo de mudanças... E, como tantos outros, também tenho meus medos e aí saí a procura de mais leitura sobre o assunto. Encontrei o texto de Marcelo Maroldi (http://www.digestivocultural.com/colunistas/coluna.asp?codigo=1766). Dos vários depoimentos sobre esse texto, o de Daniela Castilho me chamou a atenção justamente porque expressa o que venho sentindo. Diz ela:

Não existe mais receita de sucesso. O título, porém, permanece. É mais "bem visto" se você disser que é médico, engenheiro, arquiteto, advogado, artista (artista sempre está em alta no Brasil) do que se disser que é vendedor, professor, diagramador, atendente de loja, caixa ou assistente administrativo. E aí não importa se é bem ou mal sucedido financeiramente. O dinheiro é um episódio à parte: se você tem, pode ser dono de mecânica de automóvel, o dinheiro irá lhe conceder o status que a função não concede. As pessoas esquecem que a vida é feita dia a dia e que não adianta ter dinheiro ou posses ou mesmo família e amigos se você está infeliz 99% do tempo. Viver deveria ser sempre encarado como uma oportunidade única e que precisa ser aproveitada. Mas não é. Só se tem essa consciência quando se atinge a velhice. É pena.

Mudar é um risco sim! É um desafio! Mas é, antes de tudo, ou pelo menos deveria ser, a certeza de que se está em busca da própria felicidade, esteja ela na simples mudança da cor do cabelo ou numa bem mais radical como descasar... Mudar de país... Deixar a segurança do emprego... O erro faz parte da caminhada. Já diziam nossos avós “é errando que se aprende”. De que adianta viver o “certo”, o “normal” se se vive infeliz?
Eu não quero mais viver de sonhos... Nem de pesadelos! Quero rechaçar esse vazio em mim. E, para isso, estou me alimentando de desejo, criando coragem para dizer adeus ao antigo... Ao que já está ultrapassado para mim... Quero ver o sol nascer... Correr atrás das borboletas. Cansei de cultivar um jardim para que elas viessem até mim. Nada é mais importante do que eu! Não quero ficar repetindo nostálgica o que escreveu Sérgio Britto em “Epitáfio”. Não quero ter de fazer uma lista dos sonhos que eu tinha e de quantos eu desisti de sonhar! Não quero assobiar para sobreviver! Não quero... Se no final não der “certo”, pelo menos vou poder dizer: “O importante é que emoções eu vivi...”.

Roziner Guimarães

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Prólogo de um epílogo



Amanheci sem palavras. Mas, contrariando Drummond, lutar com palavras não é a luta mais vã. Então, mesmo despalavrada (perdoe-me o neologismo), tentarei escrever. O que seria de mim sem elas? Por meio delas, tentarei nomear e renomear o, por ora, absurdamente inominável. Aventuro-me a descobrir respostas para minhas interrogações... Adentro mundos surreais e tento dar a eles cores e som. No inusitado dessa caminhada, aventuro-me a vagabundear pelas alamedas obscuras do meu ser. Permito que os paradoxos criem imagens para as seculares vicissitudes diuturnas.

Não almejo falar de coisa alguma, pois, como eu já disse, estou sem palavras. Quero apenas escrever... É uma tentativa de encontrar um sentido que seja para esse despalavramento. Esse “silêncio” povoado de vozes roucas... Sigo, por caminhos encharcados, buscando, na lama dos dilemas passados e presentes, simbolizar as agruras, alegrias e amarguras da caminhada. Relembro que já ouvi que “nada é sério”. Então, contrariando uma antiga crença, reflito que nada é sério mesmo! Passa-se o tempo... E o tempo passa. E, nesse passatempo, eu, que acredito ainda na seriedade de tudo, surpreendo-me com o des-gosto das minhas crenças.Eu sempre significando aquilo que, para os outros, não tem significado algum...

Acreditando nos ensinamentos de Giambatista Vico, percebo que minha história se tornou cíclica.  Eu fui acumulando “nadas” vida a fora pensando serem eles “tudo”. E a eles dei crédito. Signifiquei-os. Tatuei-os em mim... Mas, como sempre, na minha cegueira, não percebi que eles eram apenas crenças. Subjetivismo quase atávico. Crer é confiar, acreditar. E eu acreditei. Mas de que vale a crença? A tatuagem vai se desbotando... Vai perdendo a nitidez. E, talvez, por isso, eu tenha perdido a voz. Perdido o desejo... Talvez, por isso, as palavras tenham hoje me abandonado. Fugiram para o reino do desencanto e lá permanecem mudas em seu/meu abandono. Cansaram da minha ingenuidade...

E o pensamento cria asas... Voa por terras ainda desconhecidas. Pousa numa clareira e olha ao redor. A paisagem parece um tanto conhecida. Mas, como os olhos podem se enganar, pisca e volta a contemplá-la. E ela vai ficando difusa... Opaca... Seca... O sol encarde...Vou ouvindo palavras repetidas. Ocas. Caindo uma a uma no abismo da minha ignorância. Percebo que os “nadas” que me povoam se agigantam e me revelam, à revelia, a força motriz que gera o desengano. Engodos para a sedução! Alquimia do absurdo! Avesso da espera! Como de besta eu não tenho nada: fico a espreita... Observo. Analiso. E concluo que, se “nada é sério”, pouco valor se dá a tudo. E, se pouco valor é dado a tudo, o “tudo” passa a ser nada. Não são premissas opostas. São premissas verdadeiras. Não há paradoxo. Há constatação! De um lado, “Tudo”; do outro, “nada”. Nada e tudo são antíteses e, como tais, não se coadunam. Aí está a verdade! Luz sobre as crenças. Crenças e verdades esse deve ser o aprendizado. Minhas crenças caem por terra e me revelam a verdade dos fatos.

Percebo que é necessário politizar a relação entre o que se vê e o que se sente. Entre o que é feito e o que é falado. Ação contradizendo a fala. É o dito no não-dito. Isso Bakhtin explica. Pressupostos e subentendidos. Subterfúgios. Simulacros. Disfarces! E as crenças vão sendo paradoxalmente desvendadas pela verdade! Mas o outro é sempre o causador do conflito. É a autoridade sem argumentos. Dão o nome de “fantasmas” para os fatos que a fala não consegue explicar... E o outro passa a ser visionário... Louco! Já fui personagem dessa história... Eu não quero mais negar as aparências nem disfarçar as evidências... Não quero mais ser personagem do absurdo! Não quero mais calar meu silêncio... Secar as disfarçadas lágrimas... Já que “nada é sério”, este prólogo se traduz em epílogo!

Roziner Guimarães