segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Prólogo de um epílogo



Amanheci sem palavras. Mas, contrariando Drummond, lutar com palavras não é a luta mais vã. Então, mesmo despalavrada (perdoe-me o neologismo), tentarei escrever. O que seria de mim sem elas? Por meio delas, tentarei nomear e renomear o, por ora, absurdamente inominável. Aventuro-me a descobrir respostas para minhas interrogações... Adentro mundos surreais e tento dar a eles cores e som. No inusitado dessa caminhada, aventuro-me a vagabundear pelas alamedas obscuras do meu ser. Permito que os paradoxos criem imagens para as seculares vicissitudes diuturnas.

Não almejo falar de coisa alguma, pois, como eu já disse, estou sem palavras. Quero apenas escrever... É uma tentativa de encontrar um sentido que seja para esse despalavramento. Esse “silêncio” povoado de vozes roucas... Sigo, por caminhos encharcados, buscando, na lama dos dilemas passados e presentes, simbolizar as agruras, alegrias e amarguras da caminhada. Relembro que já ouvi que “nada é sério”. Então, contrariando uma antiga crença, reflito que nada é sério mesmo! Passa-se o tempo... E o tempo passa. E, nesse passatempo, eu, que acredito ainda na seriedade de tudo, surpreendo-me com o des-gosto das minhas crenças.Eu sempre significando aquilo que, para os outros, não tem significado algum...

Acreditando nos ensinamentos de Giambatista Vico, percebo que minha história se tornou cíclica.  Eu fui acumulando “nadas” vida a fora pensando serem eles “tudo”. E a eles dei crédito. Signifiquei-os. Tatuei-os em mim... Mas, como sempre, na minha cegueira, não percebi que eles eram apenas crenças. Subjetivismo quase atávico. Crer é confiar, acreditar. E eu acreditei. Mas de que vale a crença? A tatuagem vai se desbotando... Vai perdendo a nitidez. E, talvez, por isso, eu tenha perdido a voz. Perdido o desejo... Talvez, por isso, as palavras tenham hoje me abandonado. Fugiram para o reino do desencanto e lá permanecem mudas em seu/meu abandono. Cansaram da minha ingenuidade...

E o pensamento cria asas... Voa por terras ainda desconhecidas. Pousa numa clareira e olha ao redor. A paisagem parece um tanto conhecida. Mas, como os olhos podem se enganar, pisca e volta a contemplá-la. E ela vai ficando difusa... Opaca... Seca... O sol encarde...Vou ouvindo palavras repetidas. Ocas. Caindo uma a uma no abismo da minha ignorância. Percebo que os “nadas” que me povoam se agigantam e me revelam, à revelia, a força motriz que gera o desengano. Engodos para a sedução! Alquimia do absurdo! Avesso da espera! Como de besta eu não tenho nada: fico a espreita... Observo. Analiso. E concluo que, se “nada é sério”, pouco valor se dá a tudo. E, se pouco valor é dado a tudo, o “tudo” passa a ser nada. Não são premissas opostas. São premissas verdadeiras. Não há paradoxo. Há constatação! De um lado, “Tudo”; do outro, “nada”. Nada e tudo são antíteses e, como tais, não se coadunam. Aí está a verdade! Luz sobre as crenças. Crenças e verdades esse deve ser o aprendizado. Minhas crenças caem por terra e me revelam a verdade dos fatos.

Percebo que é necessário politizar a relação entre o que se vê e o que se sente. Entre o que é feito e o que é falado. Ação contradizendo a fala. É o dito no não-dito. Isso Bakhtin explica. Pressupostos e subentendidos. Subterfúgios. Simulacros. Disfarces! E as crenças vão sendo paradoxalmente desvendadas pela verdade! Mas o outro é sempre o causador do conflito. É a autoridade sem argumentos. Dão o nome de “fantasmas” para os fatos que a fala não consegue explicar... E o outro passa a ser visionário... Louco! Já fui personagem dessa história... Eu não quero mais negar as aparências nem disfarçar as evidências... Não quero mais ser personagem do absurdo! Não quero mais calar meu silêncio... Secar as disfarçadas lágrimas... Já que “nada é sério”, este prólogo se traduz em epílogo!

Roziner Guimarães

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