terça-feira, 29 de junho de 2010

Pelos vãos da vida...

               Nos absurdos vãos da vida, às vezes, percebemo-nos cegos... Não a cegueira branca de que falou o sábio Saramago. Muito parecida com ela, mas essa é uma cegueira escura como breu, estancada nos avessos de cada um de nós. E, nessa cegueira escura, continuamos de olhos abertos, mas não conseguimos enxergar um palmo à nossa frente. É como se houvesse um apagão infinitamente grande que não nos permitisse nos perceber e perceber o outro que está às nossas costas ou à nossa frente. Abrimos os braços e tocamos apenas o vazio. Nada há na escuridão para ser sentido. E, no absurdo abismo construído entre nós e o mundo, seguimos tateando em vão. Seres demasiadamente desfigurados pela opacidade de suas irrefletidas ilusões...
               E lá vamos nós vagando cegos pelos nós cegos que atamos e que, agora, não conseguimos mais desatá-los a sós. Metáforas desmedidas num anacoluto incompleto se isso não fosse incomensuradamente absurdo! Mas o é. E, inda assim, seguimos pleonasticamente nus por vielas abandonadas e, por que não, jamais percebidas. Somos, agora, apenas e tão somente olhos incomensuradamente abertos tentando enxergar, no escuro do nosso desatinado destino pré-fabricado, o humano que jazia em nós. Tornamo-nos nós perfeitos e esses nós, inda que haja quem os desate, deixarão as marcas do nó desatado... Se é que me entendem. Se não, andemos por outros caminhos!
               Mas, preciso dizer: Não escrevo para leigos. Tenho horror à falta de leitura. Talvez por isso, tenha escolhido milimetricamente meus leitores. E é para esses leitores ensimesmados com a irreflexão do mundo que crio as minhas imagens metafóricas. Almejo que eles vejam a vida, pelo menos, como uma estrada pérvia. As pontes podem e devem ser construídas, mesmo que, para a travessia, seja necessário fazer uso do corrimão. Ou, quiçá, utilizar uma pinguela ou uma ponte suspensa por cordas... Isso pouco importa! O que não se admite é, ao perceber que a travessia é difícil, tentar atravessar a vida por um desvio, porque, se assim o for, a travessia seria impérvia, o que, além de demandar mais tempo, seria improvável a passagem! Só se consegue atravessar os abismos se, e se somente se, arrancar as vendas dos olhos e perceber a urgência na construção de pontes... Construir pontes implica observação, percepção, reflexão e ação!
               Já me disseram que tenho ares de "mãe do mundo" ou que meu discurso é "professoral"! Não ligo para rótulos! Todos somos rotulados. Isso também pouco importa! Sei bem que não tenho a pretensão de ensinar nada a ninguém e muito menos de "mudar o mundo" ... E aí os críticos de plantão afirmam: "Toda negativa é uma afirmativa" Pois bem, que seja! Mas esse não é o meu objetivo, até porque tenho consciência de que de nada disso sou capaz! Apenas teço reflexões... Crio metáforas! Todavia, se alguém quiser colocar a carapuça, que culpa tenho eu de tecê-la?

Roziner Guimarães
                



              

Um comentário:

  1. Cara escritora, seus textos sempre são uma surpresa boa. Há muito "de fora" deles. As inferências possíveis de serem "tecidas". Traz-nos grandes lições. Além de haver sempre muita, muita poesia... abençoada seja quem criou a prosa poética, pois vinculou dois sonhos: escrever e criar... Parabéns

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